sexta-feira, 9 de julho de 2010

Thor; O Cão.




















Colaboradores precisam-se:

- Para integração em equipa motivada, num ambiente de trabalho dinâmico e competitivo, de carreira promissora.

Respondi ao anúncio.

Esperavam- me os já familiares pequenos cadernos dos testes psicotécnicos com as suas opções de escolha para preencher:

- Boa tarde, queria pedir a vossa atenção relativamente à prova que vão efectuar; o tempo máximo é de 30 minutos, e apenas poderão seleccionar uma opção das diversas apresentadas, caso contrário a resposta será considerada como errada.

A assistente sai da sala, após a breve introdução, desejando boa sorte aos presentes.

Volta após os 30 minutos, que parecem ter passado rápido.

Os candidatos que passarem a fase seguinte serão contactados brevemente; Recolhe as provas de uma forma mecanizada; e rapidamente a sala fica vazia.

Passados alguns dias vêm a entrevista; reconhecem-se algumas caras na sala de espera, mas só se trocam olhares.

Num pequeno gabinete vêem as apresentações; com uma interlocutora da empresa, que entre alguns olhares penetrantes, sintéticos, lança um conjunto de perguntas em tom afável, criando-se um momento de uma cordialidade artificial que ambos reconhecemos, mas apreciável, dada a situação.

- Agradecemos a sua disponibilidade, caso passe a fase seguinte (será a final, adiantam) receberá um contacto novamente, como sucedeu na fase anterior. – Boa tarde e obrigado.

Confundo o lado da saída num corredor de gabinetes todos iguais, prontamente sou guiado na direcção destinada, por uma colaboradora já habituada a lidar com estas situações.

Passam alguns dias.

Regresso à dita empresa, após um telefonema; - Diga ao segurança que vêm para as provas no auditório, às 14:00 horas; Não se atrase, por favor, informa-me a interlocutora.

O dito auditório está desprovido de qualquer cadeira, completamente vazio. Comigo estão algumas das “caras” que fizeram a entrevista antes, já mais confiantes, trocam algumas palavras comigo e entre si também.

Alguém sabe no que consiste esta fase? Perguntamo-nos todos em voz baixa.

Abre-se uma porta ao fundo. Na nossa direcção vêm uma personagem de cerca de 50 anos de idade, de aparência forte, alto, de cabelos brancos fartos, óculos e barba, num tradicional fato e gravata.

Com ele vêem mais dois colaboradores da empresa. Lançam um ar superior, tanto o do sexo masculino como feminino, mas parecem esconder algo.

- Têm ar de estarem incomodados com o facto de terem de estar aqui, não compreendo…penso para mim.

- E que raio…porque será que têm marcas de arranhões profundos, já cicatrizados, nos braços, os dois colaboradores??

- Boa Tarde, senhores e senhoras.

Anuncia em foz pesada, forte, o Sr. De Barbas e fato a rigor.

Como têm conhecimento, esta é a última prova antes da vossa admissão na nossa empresa, a que todos os nossos colaboradores são sujeitos antes de serem admitidos.

- Thor; anda cá. – Num tom de chamamento, profere estas palavras. Os candidatos na sala ficam algo constrangidos, mas procuram não o demonstrar.

Rapidamente um mastim com cerca de 80 kilos de elevado porte, entra pela porta e senta-se ao lado do Sr. De Barbas, agora um “estranho interlocutor”, aos olhos de todos os candidatos na sala.

Não se assustem peço-vos; O Thor é bastante pacífico. Anuncia-nos este “estranho interlocutor” novamente.

- A vossa prova consiste apenas em que cada um de vôs, tente agarrar o Thor, e que ele se deite no chão, anuncia confiante da sua voz em tom grave o estranho interlocutor.

- Não vos fará mal, se não o aleijarem, os que quiserem, podem desistir já.

O desalento percorre a cara de algumas jovens, que nos seus saltos altos, e na tentativa de causarem boa apresentação tinham caprichado o seu visual. Algumas delas pesavam pouco mais do que metade do Thor.

Penso para mim…tentar agarrar um cão destes…nem mesmo o pessoal com mais “cabedal” daqui têm hipóteses…

- Posso fazer uma pergunta? Coloco a questão ao “estranho interlocutor” como se de uma insuspeitada curiosidade se tratasse.

- Sim, responde num tom enfastiado.

- O Srº sabe bem que não existe forma de uma pessoa unicamente agarrar um cão destes.

- Só em conjunto, todos juntos. De resto não têm hipóteses, além do mais acho lamentável que utilize um animal para testar o comportamento humano. A liga de defesa dos animais e toda a comunicação social, vai saber disto, garanto-lhe.

- Faça o favor de sair imediatamente e assine a folha com o seu nome na portaria. Informa-me; Mas a sua voz perdeu o tom confiante, demonstrando agora alguma insegurança e medo.

Antes de sair, tento fazer uma festa na cabeça do Thor, de ar até afável, apesar de imponente.

Dá um salto repentino, colocando-se de imediato em fuga, sendo facilmente perceptível que foi treinado para que não se deixe sequer tocar por ninguém; Ficando quase fora do controlo do “estranho interlocutor”.

Caiu pelo chão a ultima prova do “estranho interlocutor”, desmascarada.

Aproveito ainda para lhe dizer:

- Então é assim que você educa um cão….com base no medo, para servir os seus propósitos….ainda bem que saio daqui e já …empresa de carreira promissora…que vergonha….

- Se não quer efectuar a prova, saia imediatamente, já disse!; Cada vez mais perturbado, afirma o “estranho interlocutor”.

Os candidatos ficam nervosos.

Já junto a porta, viro-me para os candidatos e afirmo:

Tentem agarrar o cão, mas todos juntos, caso contrário não têm hipótese, e lembrem-se disso para qualquer coisa que queriam fazer nesta empresa de “de carreira promissora”.

E vim-me embora.

Por causalidade, encontrei um dos candidatos, passados alguns dias na rua, que me contou o desfecho da prova.

- Alguns ao inicio acabaram por tentar agarrar o Thor sozinhos, foram lançados ao ar, arrastados como meros bonecos, até não terem mais forças para aguentar.

- Mas agarrar o Thor, é que nem pensar…até que houve alguém na sala que se lembrou de formar um grupo de seis pessoas, que muito a custo lá conseguiu agarrar o Thor.

- O velho passou-se e correu com todos nôs dali aos gritos...dizia o candidato, embora com um sorriso de vitória na sua cara.

- Viemos a saber depois (por uma colaboradora que já lá estava há algum tempo) que esta ultima prova, não era na realidade um teste, mas uma rasteira.

Como ninguém conseguia agarrar o Thor sozinho, no final, o velho das barbas dizia;

-Bem a sua prova foi notável, mostrou uma grande tenacidade, mas falhou no objectivo final, de agarrar o Thor; No entanto gostaríamos de contar com a sua colaboração, só que dado a falha no teste, teremos que proceder a um reajuste em termos de funções e vencimento…Está interessado?

- No futuro quando se sinta capaz, pode tentar realizar esta prova novamente…a empresa valoriza o empenho profissional, como calcula….

- Impressionante….comento, com o jovem candiatado.

- Não deixes que o futuro seja assim de agora em diante, independentemente de qualquer factor seja tempo, oportunidade ou sentimento, que esta história , por um minuto apenas, seja jamais esquecida.

Para que não se repita nunca mais no futuro.

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