sábado, 15 de maio de 2010

Just “Another” Flight














Ao chegar a um determinado nº de missões, muita coisa se pondera; O entusiasmo do inicio, juntamente com o espírito de descoberta, não deixava sequer espaço para estas reflexões.

E assim, mais uma vez, esta tripulação encontra-se no “Briefing Room” para mais uma missão.

Não deixo de notar, que a mente atira ao ar, em jeito de formulação, perguntas sobre a razão de tudo isto.

Só me coloco novamente no contexto da enorme sala quando escuto: “- alvos definidos em zonas industriais em países ocupados pelas forças inimigas”.

- Decerto que a minha face deixou de imediato transparecer algum desalento, pois o Co-piloto comentou de imediato, para mim:
- Não te agrada muito, pois não? Falta a motivação não é??

- Digo-lhe que não, mas na realidade penso que sim; O Bombardeamento de civis, forçados a trabalhar num esforço de guerra por uma nação que os ocupa – não me agrada, além que o carácter rotineiro destas surtidas desgasta a moral, muito mais do que uma missão difícil, em território inimigo.

Vinda de uma profunda revisão mecânica, olho com desconfiança para a fortaleza voadora.

Após insistência do Sr. Comandante de Esquadra, lá nos dirigimos ao hangar da manutenção para proceder a sua recolha.

- E como esperava, mal levantamos para um pequeno voo de teste, detectam-se de imediato, falhas em diversos equipamentos.

O Sr. Comandante fica furioso; Dá me ordens de imediato de efectuar meia volta, direito ao hangar; chama o pessoal da manutenção, e prega-lhes uma valente “descasca” com ameaças de tribunal marcial caso alguma coisa fique por verificar.

- A resposta vêm num tom baixo, deveras indolente, que ainda mais irrita o Sr. Comandante.

- O co-piloto apanha de boleia da fúria do Srº Comandante, e afirma: - se isto sucede mesmo em território ocupado, podemos ter que saltar de pára-quedas…e decerto que vamos parar às mãos da Gestapo…estes gajos não sabem o que nos podem arranjar…

- Lembro-me de efectuar uma “detalhada inspecção” por minha conta, antes de partir em missão, estranhamente o motor nº2 apresenta falhas aleatórias, sem causa aparente.

- De modo a evitar mais confusões e demoras, o co-piloto lá consegue que o motor nº2 se aguente sem falhar, com a ajuda de alguns mecânicos de outra esquadra… (se o Comandante soubesse…estávamos fritos…) mas não se encontra uma causa para o sucedido.

Chega o dia da Partida.

Inúmeros membros de outras tripulações, oferecem-nos em pleno "Taxiway" uma ovação como nunca tinha sucedido, como se da última missão se tratasse.

A tripulação ocupa os seus postos, artilheiros e navegador – Céu pouco nublado – E deixamos a pista para trás.

Pouco tempo ainda decorrido de voo, e o motor nº2 faz das suas outra vez – falha e com o peso da aeronave, sente-se um verdadeiro “arriar” em pleno ar.

Consigo aterrar num pequeno aeródromo de apoio, e lá tento dar um jeito no motor nº2.
A tripulação manifestava um pesado ar de desânimo, e se tivéssemos que regressar à base, ao hangar da manutenção – era uma vez a missão.

“-Se o comandante soubesse disto” – Penso; Quem ia a conselho de guerra era eu – efectuar reparações numa aeronave sem estar devidamente habilitado, colocando a aeronave e tripulação em risco, em linhas inimigas…É grave…muito grave..

Subitamente algo bate contra o Pára-brisas do lado do co-piloto, com grande violência, mas o vidro aguenta – Um “birdstrike”? Talvez, mas nem deu para ver.

O Co-piloto coloca no seu rosto uma expressão algo carregada, sabendo que se o para brisas cedesse, estaria em sérios apuros…

Depois de diversas paragens, e algumas peças tiradas ao motor nº2, entramos em Espanha. Mas a tensão é elevada no cockpit.

Os motores vão a rotação mínima possível para evitar esforços, e qualquer pequeno solavanco resulta num olhar nervoso para o painel de instrumentos.

Cai a noite, e ao fundo vislumbra-se algo parado na berma – É uma B-25 !! Caíram-lhe as luzes de navegação…

Não pensei que pudesse ser grave – uma chave de fendas resolvia o problema, mas à medida que foi ficando para trás, lamentei o facto de não ter parado e oferecido ajuda…o que parecia simples para mim, podia ser desesperante para aquela tripulação e lembrei-me tarde demais desse facto – um erro que não quero repetir.

Já em França perto de um “rendez-vous” com pessoal conhecido – o motor nº2 começa a falhar repetidamente, com grande intensidade – faltando apenas 20 km para estarmos em segurança…
Lá conseguimos chegar ao nosso destino, perante a incredulidade do nosso interlocutor e amigo Francês perante o nosso tom grave ao descrever a anomalia.

Seguem-se dois dias de visitas….verdadeiramente impressionantes os blindados de uma pequena cidade chamada Saumur …sendo que colecciono modelos de blindados, senti-me verdadeiramente dentro de uma vitrina a ver os modelos que tenho expostos…

Com direito a guia local (o nosso estimado amigo Francês) dá-se uma volta ao circuito de Le Mans, na parte aberta ao público.

Impressionante, os lugares comuns, mera estrada por onde circulam donas de casa nos seus utilitários, carrinhas que trazem as crianças da escola, é o palco de uma corrida que uma vez por ano desde 1923, leva ao limite homens e máquinas.

Mais interessante que o rico museu das 24 horas, confesso.

Rumamos em direcção a Normandia, e descobrimos o mercado local, em St. Mère Eglise, que entretanto durante a manhã, já decorria alegremente.

Dá para compreender (e bem!!) que a riqueza de um país, de uma região, reside na sua comida peculiar, nos produtos produzidos a nível regional, parte de uma identidade, que se alguma vez for esquecida, é a maior derrota que um povo terá que suportar.

As diferenças, de região para região, de País para País, são parte de uma identidade, que é força fundamental quanto é necessário, por exemplo, para enfrentar problemas.

As possíveis soluções encontradas, face a essas dificuldades, naturalmente são diferentes, mas adequadas no seu fim.

A aplicação de uma solução “standard” via globalização, constitui um sério enfraquecimento, das capacidades de autodefesa de um povo e de uma nação, encerrando em si o potencial destrutivo de uma civilização inteira, se não for desde já combatido.

Em ritmo de passeio, pelas famosas praias do dia “D”, pejadas de museus a pagar, ainda se consegue descobrir um pequeno bunker original, bastante destruído, que guarda em si, todos os dramas do dia “D”.

Após uma pequena corrida para chegar a horas ao Camping, em que fomos inaugurar, o inicio de época do parque, somos recebidos com grande simpatia.

Podemos abastecer de água – e fazer comida…mas…A B-17 afunda-se no solo, tal Panzer, e não sai do sítio de forma alguma.

Na Normandia, perante a dificuldade, se te enrolares tal caracol, não tens hipótese. Nenhuma.

A atitude têm que ser outra, a de enfrentar, meteres-te à fria chuva, ires buscar energias onde já cansado pensavas não existirem – é assim e não há outra forma.
Segue-se a Bélgica – deprimida – escaqueirada.

Bruxelas acaba por ser o espelho de uma gigantesca Europa comunitária que vai de mal a pior.

Tal gigante, quanto maior, mais dificuldade têm para andar – quando tropeçar – e cair; Pobres dos membros que suportarem a queda – com um peso assim grande, será bem mais do que uma esfoladela.

Chegamos assim aos Países Baixos – Surpresa total.

Deixamos a B-17 no Camping, e como era perto, vamos a pé para o centro da cidade de Delft.

Percorremos um bairro, já com a noite cair e o frio aperta.

- O pessoal daqui não usas cortinas!! – diz um dos artilheiros

- Janelas até ao chão e sem grandes de protecção!! – diz o co-piloto..havia de ser...não duravam 1 hora na nossa terra!!

Poucas ou nenhumas viaturas se vêem a circular - Só bicicletas – e com muito frio…caí uma chuvada forte – sem guarda chuvas, temos que regressar ao camping- sempre com muita cordialidade e simpatia informam-nos que podemos apanhar um táxi na estação central.

Algo perdidos, pergunto a direcção da estação central dos comboios a uma jovem, que prontamente oferece – literalmente – o seu guarda-chuva para que os artilheiros não fiquem ainda mais encharcados.

Fiquei completamente sem palavras – mais ainda quando vi na cara da jovem tristeza, por ter declinado cordialmente a oferta.

Seguimos viagem, paramos numa cidade onde caminhamos tipo gigantes, por entre aeroportos, ruas, monumentos, todo um país, vale a pena descobrirem Madurodam.
Pela tarde chegamos à cidade das almas perdidas, em pleno Domingo de Páscoa.

Tudo é permitido.

As pessoas de lá têm um ar feliz? Não.

Excelente campo de treino para potenciais religiosos, pois eximia que é em colocar todas e mais algumas tentações e pecados ao alcance, só o realmente forte de espírito lhe resistirá.

O dinheiro é a única dimensão humana que valoriza; é assim portanto muito pobre.

Envenena toda a Europa, desde os mais novos aos mais velhos; O curioso é que ninguém lhe diz basta.

Parem um pouco nas suas ruas, observem. Na dicotomia entre o bem e o mal, verdadeiras batalhas se travam aqui, de consequências não menos trágicas, daquelas em que muitos milhares de soldados se enfrentam.

Esta “Sin-City” pode ser o teu fim ou o teu inicio. És tu com as tuas atitudes que decides.

Já sabe esta cidade que está condenada a fim trágico, podes encontrar na história muitos exemplos de cidades iguais.
A sua vitória é arrastar-te para um final trágico enquanto indivíduo, e por isso tudo te oferece – a troco de dinheiro; É claro. - Até mesmo um simples copo de água têm preço.

Locais destes não deixam muitas saudades, quando comparados com a Bela Paris, em que após muitos anos passamos pelas suas ruas ainda que muito brevemente.

No regresso a já “familiar” Andorra, o seu comércio indicia um empobrecimento nunca dantes visto nas suas lojas, veremos o que lhe reserva o futuro, têm na simpatia do seu povo, na sua determinação, a maior das mais-valias.

Em Espanha perto de uma (conhecida) área de serviço alinham-se numerosas sombras frente aos faróis de cerca de uma dezena de carros da “Guardia civil”.

Os pirilampos azuis das viaturas iluminam a noite clara, parece ser dado adquirido que o que os jornais apresentam como “ desemprego e crise” têm uma face real bem mais dramática.
A criminalidade aumenta, empobrecendo a socidade de uma forma muito mais terrível do que a material, com a insegurança generalizada, sempre conveninte no entanto, a uma figura de estado ditatorial, que assim têm justificação para todas as medidas que desejar tomar.
Aconteceu no passdo, com uma pequena "desatenção" poderá suceder no futuro.

Casa – destino desejado; Informo a tripulação que vou pedir licença.

O nível de cansaço é cada vez mais elevado após cada missão – o stress tende a subir cada vez mais, e sinceramente existem outras formas de travar esta guerra, que merecem ponderação da minha parte.

A próxima surtida? Não sei.

Já depois da Aeronave entregue, tenho o prazer por causalidade de encontrar um Srº Coronel, venerável veterano de inúmeras missões.

Com o seu corpo fortemente castigado por inúmeras batalhas que lhe deixaram graves mazelas, com uma determinação absoluta, informa-me que vai partir em breve com a sua fortaleza voadora, em direcção a território inimigo.

Confesso-lhe que desde já há muito via a sua fortaleza voadora parada, e saúdo-o com alegria e com todo o apoio que necessitar da minha parte.

A sua maneira de estar é uma verdadeira inspiração, apesar de todas as sérias dificuldades que enfrenta.

Um exemplo enquanto pessoa, que um país inteiro deveria ter como fonte inspiradora, em momentos difíceis.

2 comentários:

  1. É incrível o seu background.... as aventuras de percorrer o desconhecido e ainda assim saber falar sobre ele com o descernimento de quem sabe o que está a viver, dentro daquilo que é o mundo em si. Há pessoas que carregam o conhecimento em si pela prática da vida, o que as enriquece e enriquece quem as conhece, e as sabe ouvir e transportar-se para essas paragens descritas.
    Obrigada por partilhar as suas viagens.

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  2. Encontrará sempre aqui uns “estranhos relatos” de uma estranha realidade, de uma percepção que gosto de compartilhar.
    Porque nesta aprendizagem que é a vida, acredito que muito podemos aprender uns com os outros; apenas necessitamos estar dispostos a isso.
    Muitas felicidades, Dark angel.

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